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Notícia

  • Coágulos nunca mais

    Se eles bloqueiam as veias, é sinal de trombose no pedaço. Mas um novo procedimento chega para desentupir os encanamentos do corpo

    Quando perguntam ao cirurgião vascular Francisco Osse, do Centro Endovascular de São Paulo, qual a sua profissão, ele costuma responder: "Sou um encanador de luxo". É que o médico trabalha com as tubulações de uma propriedade muito especial, o corpo humano. Dentro dele, há canos que distribuem o sangue cheio de oxigênio, as artérias, e outros que conduzem o líquido de volta à estação de tratamento formada pelo coração e os pulmões, as veias. Ambos podem enferrujar e alojar coágulos, um emaranhado de células sanguíneas que atrapalha a circulação. "Mas esse fenômeno é dez vezes mais comum nas veias", diz Osse.

    Por uma conjunção de fatores, que englobam de predisposição genética a traumas físicos, a coagulação, indispensável para conter hemorragias, se intensifica demais, a ponto de gerar uma massa sólida de sangue que bloqueia o fluxo rumo ao coração. "O coágulo parece uma gelatina endurecida e pode se estender por um longo trecho da veia", descreve Osse. E os vasos da perna são o maior berçário de trombos. "Isso porque eles sofrem mais para vencer a gravidade", diz o cirurgião vascular Nilo Izukawa, do Complexo Hospitalar Edmundo Vasconcelos, na capital paulista. O perigo é que os coágulos boicotam o trânsito sanguíneo, gerando a trombose, e ainda podem soltar pedacinhos que viajam até os pulmões, causando a temida embolia pulmonar, problema por trás de insuficiência respiratória e altamente mortal. Ainda bem que um procedimento à base de cateteres e stents começa a ser difundido no país para desentupir o cano e prevenir o sufoco (veja o infográfico ao virar a página).

    Não basta perambular dentro dos encanamentos venosos para entender como os trombos são eliminados. Convém esmiuçar o que favorece seu aparecimento. Muitas vezes, a pessoa carrega desde o berço um defeito no conjunto de reações químicas batizado de cascata de coagulação. "Indivíduos com sangue A positivo têm uma deficiência em uma das moléculas desse processo", exemplifica Osse. Há inclusive quem apresente, por influência dos genes, uma condição conhecida como trombofilia e, assim, é naturalmente mais suscetível à trombose.

    Mas o gatilho pode ser puxado por uma simples pancada, que lesa a parede da veia, ou, por outro lado, pelo repouso prolongado: tempo demais sentado no avião ou acamado no leito hospitalar. No caso, o mal é desencadeado porque o sangue circula lento demais. "Cirurgias e infecções também contribuem para o problema porque, quando as células morrem, liberam substâncias que interferem na coagulação", conta o cirurgião vascular Jackson Caiafa, da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular (SBACV). Até doenças como o câncer e seu próprio tratamento somam forças em prol dos trombos.

    Outra condição que, sem querer, patrocina a doença é a gravidez. "Com o útero grande, o sangue tende a retornar das pernas mais devagar. Além disso, a gestação altera a coagulação", explica o cirurgião vascular Alexandre Fioranelli, do Hospital e Maternidade São Luiz, em São Paulo. "O risco é ainda maior no pós-parto, daí por que indicamos à paciente voltar a andar o quanto antes depois de o beber nascer", diz. Mesmo as mulheres que não querem filhos agora devem tomar cuidado: alguns anticoncepcionais tendem a incentivar a confusão nas veias ao mexer com a cascata coagulante.

    À caça dos coágulos

    Nem sempre a trombose dá sintoma, mas é comum ela se manifestar por meio de inchaço, dor e fadiga no local do problema. Os especialistas se valem de um ultrassom com doppler para rastrear entupimentos venosos. Com o diagnóstico dado, a terapia varia de acordo com a gravidade da situação. Pode-se recorrer a comprimidos que atenuam a coagulação destrambelhada e meias elásticas para prevenir que a situação piore. "As meias comprimem mais intensamente o tornozelo e a pressão diminui à medida que ela sobe até a coxa. Isso auxilia o retorno venoso", explica o cirurgião vascular Marcondes Figueiredo, da SBACV. Coágulos maiores exigem medicamentos injetados, como as heparinas, que visam brecar sua evolução.

    Mas, quando os trombos dominam as veias pra valer, não basta impedir que eles cresçam. É preciso tirá-los de cena. Aí entra o tratamento endovascular, que, por meio de cateteres, drogas e stents, devolve a liberdade ao vaso entupido. "O método promove uma revascularização rápida e eficaz e o paciente volta à vida normal em até dez dias", conta Osse. É mais uma ferramenta para o encanador salvar o nosso corpo.

    A estação de tratamento do sangue
    Entenda a circulação e de onde vêm os trombos

    1. A bomba
    O coração bombeia o sangue para todo o corpo. O líquido é levado pelas artérias, que se ramificam em vasinhos para contemplar os braços, as pernas, os órgãos internos, a cabeça...

    2. Tudo tem volta
    As veias mandam o sangue usado, e sem oxigênio, de volta para o coração e os pulmões. Acontece que aquelas situadas nas pernas têm maior risco de abrigar coágulos.

    3. Chama as vizinhas
    O coágulo pode crescer e se estender por uma veia grossa. Aí, o fluxo do sangue diminui. Para compensar, outras veias menores se dilatam e enviam sangue para cima.

    4. Pedaço à solta
    Além de bloquear a passagem do sangue, causando a trombose, o coágulo faz ameaças a distância. Afinal, um pedaço pode se desprender dele e subir a correnteza — é o êmbolo. Ele viaja ao pulmão e entope uma de suas veias, detonando a embolia pulmonar, condição por vezes fatal.

    A matemática da trombose

    Composição do sangue + Fluxo do sangue + Parede de vela

    Eis a tríade de Virchow, teoria criada por um médico alemão em meados do século 19 e que permanece atual.

    Ela anuncia os três fatores que dão origem à trombose: uma lesão na veia (por um trauma), um defeito na composição do sangue (pessoas que nascem com uma falha na coagulação) e uma alteração no fluxo sanguíneo (um exemplo é o repouso prolongado).

    Quando dois deles se somam, é trombose na certa.

    Desentupidor de veias
    Como age o tratamento endovascular para trombose

    > Eis a trombose
    Quando ela compromete uma veia da perna, o médico pode recorrer ao tratamento endovascular, que exige anestesia.

    > Lá vem o tubo
    O cirurgião faz uma punção na virilha, no pescoço ou perto do joelho e conduz um cateter até a área entupida pelo coágulo.

    > Adeus, trombo
    Com o cateter se injeta um remédio que, aos poucos, dissolve o coágulo. Essa etapa dura de 24 horas a cinco dias, se a trombose for crônica.

    > O intervalo
    Depois de receber a droga via cateter, o paciente permanece no hospital na unidade intensiva ou semi-intensiva para ser monitorado.

    > Hora do balão
    Assim que a veia está limpa, é feito o implante do stent, balãozinho que libera a passagem de sangue pelo vaso. Isso dura de uma a duas horas.

    > Cano livre
    Depois que o stent é armado, o paciente toma alguns remédios para evitar rejeição. Graças a essa pecinha, a veia continua desentupida.

    Drogas desentupidoras

    Os médicos contam há décadas com anticoagulantes que previnem a trombose, como a popular varfarina. Em ambiente hospitalar, casos mais graves são tratados com injeções de heparina de baixo peso molecular. Uma nova geração de remédios foi recentemente aprovada no Brasil para evitar o problema depois de cirurgias de joelho e quadril, uma complicação comum. "São comprimidos com resposta igual ou superior às drogas atuais e que não interferem com outras medicações e dieta", diz o cirurgião vascular Francisco Maffei, da Universidade Estadual Paulista.



    Fonte: Revista Saúde